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A citação com hora certa na carta precatória.

Incoerência criada pela Reforma pontual do Código de Processo Penal
Louváveis as alterações trazidas, já que o texto original, editado pela Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973, não respondia à necessidade de celeridade e eficácia do provimento jurisdicional, diante do agigantamento e massificação das relações sociais. Entretanto, não é a reforma processual civil nosso foco.
No mesmo contexto, optou o legislador pátrio por realizar uma reforma no Código de Processo Penal. E, tal como fizera com o Código de Processo Civil, resolveu fracionar a reforma em leis específicas.
Assim, importantes e profundas modificações foram trazidas pelas Leis 11.689/08, 11.690/08 e 11.719/08, com a divisão dos procedimentos comuns em ordinário, sumário e sumaríssimo, em função da pena máxima aplicada e não mais em razão do tipo de pena, ou seja, reclusão ou detenção.
Tanto em uma, quanto noutra reforma, o que se busca é a maior efetividade do instrumento processual, isso sem se descuidar dos princípios e garantias processuais.
Entretanto, convém salientar que reformas pontuais, que visem a tratar os temas de forma estanque – opção adotada pelo nosso legislador –, potencializam a ocorrência de inconsistências e lacunas no sistema legal, conquanto, em alguns casos, o texto legal perca conectividade com outros artigos aos quais façam referência.
Nesse passo, o legislador trouxe a figura da citação com hora certa ao processo penal. Dispõe o artigo 362 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela citada Lei 11.719/2008: “Verificando que o réu se oculta para não ser citado, o oficial de justiça certificará a ocorrência e procederá à citação com hora certa, na forma estabelecida nos arts. 227 a 229 da Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil”.
Depreende-se do artigo 227 do Código de Processo Civil que, havendo suspeita de ocultação, tendo sido o réu procurado em seu domicílio ou residência por três vezes, deverá o oficial de justiça intimar a qualquer pessoa da família, ou, na falta, a qualquer vizinho, de que no dia imediato, em hora designada, voltará para efetuar a citação.
Dispõe o artigo 228, do mesmo Código, que no dia e hora designados, o oficial de justiça, independente de novo despacho, comparecerá ao domicílio ou residência do citando, a fim de realizar a diligência. Não estando o citando presente, após informar-se do motivo, dar-se-á por feita a citação, deixando a contrafé com pessoa da família ou qualquer vizinho, declarando-se o nome.
Vê-se, pelos dispositivos do Código de Processo Civil, que a ultimação da citação com hora certa deva se dar no local do domicílio ou residência do citando. De outra forma não poderia ser.
Chamamos atenção para a incoerência criada entre o artigo 355, § 2º e o artigo 362, ambos do Código de Processo Penal. O artigo 362, vimos, versa sobre a citação com hora certa. Já o artigo 355, §2º, versa sobre a devolução da carta precatória pelo juízo deprecado.
Dispõe o §2º do artigo 355 do Código de Processo Penal: “Certificado pelo oficial de justiça que o réu se oculta para não ser citado, a precatória será imediatamente devolvida, para o fim previsto no artigo 362.”. (grifo nosso).
Observe a incoerência entre os citados dispositivos legais: o artigo 355, §2º, determina que, se o réu se oculta para não ser citado, a carta precatória deve ser devolvida ao juízo deprecante para os fins do artigo 362: a citação com hora certa.
Ou seja, devolver-se-ia a carta precatória para que o juízo deprecante proceda à citação com hora certa. Todavia, não há como proceder à citação com hora certa fora da comarca de domicílio ou residência do réu a ser citado.
Parece-nos lógico que, para o cumprimento do espírito da lei e da vontade do legislador, caso se verifique que o réu se oculte para não ser citado, não se deva devolver a carta precatória à origem, e, sim, proceder a própria citação com hora certa.
Aprioristicamente temos que a reforma ao Código de Processo Penal, levada a efeito pela Lei 11.719/2008, acarretou em prejudicar §2º do artigo 355 do mesmo codex, pois, em se devolvendo a carta precatória à origem, para que se proceda a citação com hora certa, estar-se-ia trilhando na linha inversa proposta pelas reformas processuais, que visam à instrumentalidade, à efetividade, e à prestação jurisdicional de forma eficaz e célere.
Aliás, ouso dizer que a devolução da carta precatória à origem carece de lógica, ao que se deve atentar o operador do direito.

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