Função Social da Empresa
Extraído do artigo pulicado no site Jus Navigandi: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6967
Publicado no Jornal Tribuna Liberal de 05/08/09
Publicado no Jornal Tribuna Liberal de 05/08/09
O substantivo função, do latim functio, é derivado, na referida língua, do verbo fungor, cujo significado é de cumprir algo, ou desempenhar-se um dever ou uma tarefa.
Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa compilado por Aurélio Buarque de Holanda, função “Ação própria ou natural dum órgão, aparelho ou máquina”
Juridicamente, podemos entender a função como um conjunto de incumbências, direito e deveres, que gravam a atividade a que estão atrelados, como por exemplo o exercício da propriedade, de cargo público, o contrato, a empresa, entre outros, e impõem um poder-dever ao exercente da referida atividade, o proprietário ou possuidor, o servidor público, os contratantes e o empresário.
Entretanto, não se deve entender esse poder-dever “no sentido negativo, de respeito a certos limites estabelecidos em lei para o exercício da atividade, mas na acepção positiva, de algo que deve ser feito”
É nesse contexto que se insere o instituto da Função Social, caracterizando-se como o poder-dever do titular da atividade, de exercê-la de acordo com os interesses e necessidades da sociedade, visando a uma sociedade livre, justa e solidária.
Com relação à Função Social, a Constituição da República Federativa do Brasil expressamente reconheceu o Princípio da Função Social da Propriedade, trouxe também, uma nova visão com relação aos contratos, devendo eles atenderem aos Princípios Gerais da Atividade econômica, assim implicitamente reconhecendo a existência do Princípio da Função Social dos Contratos.
O caráter social da Constituição de 1988 mudou a visão do direito, do capital, da propriedade e da sociedade. Assim ficou consignado na carta magna a visão de que o capital, a propriedade e seus acessórios deveriam trabalhar para o bem da sociedade e não o contrário.
No mesmo sentido, em 2002, o novo Código Civil, trouxe expressamente o princípio da Função Social dos Contratos, e implicitamente o princípio da Função Social da Propriedade.
Inicialmente deve-se esclarecer que a Função Social da Propriedade “não se confunde com as limitações ao exercício do direito de propriedade, decorrentes do direito de vizinhança, de normas urbanísticas e administrativas, dos Códigos de Minas, de Caça, de Pesca e Florestal, entre outras”, é ela um poder-dever, uma obrigação positiva imposta ao titular do direito de propriedade, na qual deve ele exercer seu direito em harmonia com os fins legítimos da sociedade.
O renomado jurista Celso Ribeiro Bastos, afirma que “a propriedade como direito fundamental não poderia deixar de se compatibilizar com a sua destinação social; por conseguinte, tem necessidade de harmonizar-se com os fins legítimos da sociedade”
Ainda segundo José Afonso da Silva, o princípio da função social da propriedade transforma a propriedade capitalista, sem socializá-la, constituindo-se como um princípio ordenador da propriedade e incidindo sobre seu próprio conteúdo.
Assim, parece-nos claro que sobre o poder de controle empresarial aplique-se o princípio da função social da propriedade, nascendo assim o instituto da Função Social da Empresa.
O princípio da função social da empresa, tal qual os princípios da função social da propriedade urbana e da função social da propriedade rural, é decorrente do princípio constitucional da função social da propriedade, e a ele está intimamente vinculado.
Assevera José Afonso da Silva, que o princípio constitucional da função social da propriedade “ultrapassa o simples sentido de elemento conformador de uma nova concepção de propriedade como manifestação de direito individual, que ela, pelo visto, já não o é apenas, porque interfere com a chamada propriedade empresarial” e conclui que o “direito de propriedade (dos meios de produção principalmente) não pode mais ser tido como um direito individual”,[1] devendo ele atender primariamente às necessidades da sociedade, isto é, à sua função social.
Para tratarmos de função social da empresa é necessário retornamos ao conceito triplo de empresa, a qual é formada pelo empresário (sujeito de direito, pessoa física ou jurídica), pelo estabelecimento e pelo fundo de comércio.
A função social da empresa reside não em ações humanitárias efetuadas pela empresa, mas sim no pleno exercício da atividade empresarial, ou seja, na organização dos fatores de produção (natureza, capital e trabalho) para criação ou circulação de bens e serviços.
A função social da empresa encontra-se na geração de riquezas, manutenção de empregos, pagamento de impostos, desenvolvimentos tecnológicos, movimentação do mercado econômico, entre outros fatores, sem esquecer do papel importante do lucro, que deve ser o responsável pela geração de reinvestimentos que impulsionam a complementação do ciclo econômico realimentando o processo de novos empregos, novos investimentos, sucessivamente.
Nesse sentido, atinge ela somente à Empresa e ao Estabelecimento Comercial, separando-se o Empresário, uma vez que ele é somente o titular do direito de propriedade gravado pela função social, sujeito de direitos ao qual se impõe o poder-dever de exercê-lo de acordo com os interesses e necessidades da sociedade, procurando “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”, sem no entanto perder a noção de seus interesses privados.
Do exposto podemos concluir que a função social da empresa é equivalente à função social da propriedade dos bens de produção, estando ela afeta somente à empresa, enquanto atividade que deve se exercida observando-se sua função social; ao estabelecimento comercial, que deve ser utilizado para o exercício da atividade empresarial com observância à função social; restando separado o empresário, como o sujeito de direito que deve exercer a atividade empresarial de acordo com a sua função social.
Descumpre, assim, a função social da empresa aquele empresário que faz uso da prática da concorrência desleal, que exerce sua atividade de modo gravoso ao meio ambiente, aquele que não observa a segurança e a saúde de seus funcionários e clientes, aquele que sonega ou deixa de recolher os impostos e direitos trabalhistas, aquele que pratica atos de ingerência, entre outros tantos motivos.
[1] SILVA, José. A. Curso de direito constitucional positivo. 17.ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 287.
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