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Princípios orientadores do Código Civil.

Publicado no Jornal Tribuna Liberal de 01/12/09


Em 10 de janeiro de 2002, após mais de 30 anos de elaboração e tramitação, foi promulgado o Código Civil Brasileiro, conhecido também como “novo Código Civil”´(nCC), contendo 2.046 artigos,  tendo entrado em vigor do dia 10 de janeiro de 2003.
Buscou-se, no desenvolvimento do Projeto do Código Civil brasileiro, preservar sempre que possível as disposições do Código de 1916, uma vez que, segundo o jurista Miguel Reale, responsável pela elaboração do projeto do código, “cada texto legal representa um patrimônio de pesquisa, de estudos, de pronunciamentos de um universo de juristas”.
Porém, obviamente, de 1916 (data da promulgação do código revogado) até 2002 a realidade da sociedade mudou, tendo o novo Código que abandonar a concepção individualista que norteava o antigo, adotando o princípio social do direito contemporâneo, já recepcionado pela Constituição Federal de 1988.
A elaboração do Código Civil, atualmente vigente, baseou-se em três princípios orientadores, aplicáveis não só à elaboração do código em si, mas também à sua aplicação pratica e à todo o direito privado, são eles: Socialidade, a Eticidade e a Operabilidade.
Dos três princípios orientadores do novo Código Civil certamente o mais marcante é o Princípio da Socialidade. Consiste ele na prevalência dos valores coletivos sobre os individuais, sem perda, porém, do valor fundamental da pessoa humana.
Procurou-se então a elaboração do Código atentando-se a esse novo princípio, que não somente buscava adequar as normas a fim de dá-las um sentido social, mas também visava a refletir as mudanças ocorridas na sociedade, tendo como finalidade, assim como consignado no Preâmbulo da Constituição Federal, uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social, possuindo como valores supremos o livre exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça.
Como citado acima, muitas das mudanças consignadas no novo Código foram decorrentes da adaptação ao Princípio da Socialidade, ressaltamos no direito de família em razão da igualdade entre o homem e a mulher, a mudança do antigo “pátrio poder”,  o qual era exercido pelo pai de família, para o novo “poder familiar”, exercido por ambos os cônjuges em razão da família e dos filhos, ainda no direito de família.
Reale em seu artigo Visão Geral do Projeto de Código Civil, ainda cita, que em virtude do princípio de socialidade, ocorre o surgimento de um novo conceito de posse, a posse-trabalho, ou "pro labore", razão pela qual o prazo de usucapião de um imóvel é reduzido, conforme o caso, se os possuidores nele houverem estabelecido a sua morada, ou realizado investimentos de interesse social e econômico
Devido também ao referido princípio, foram revistos e atualizados os antigos conceitos de posse e propriedade, devendo seu exercício estar em consonância com os fins sociais da propriedade. Assim, como já dito acima, prevaleceu nesse sentido o princípio de que os interesses e necessidades da coletividade se sobrepõem aos interesses individuais, sem perda, porém, do valor fundamental da pessoa humana, devendo a propriedade, primariamente, atender à sua função social.
Surge então no Direito Civil, e se reforça com o princípio da socialidade, o instituto da Função Social, já consignado no diploma Constitucional, podendo o mesmo atingir os bens móveis e imóveis, os contratos, e no presente estudo a empresa, matéria a ser discutida nos próximos capítulos.
Como segundo princípio orientador tem-se a Eticidade, característica também marcante no novo Código, ao atenuar o rigorismo normativo, contrastando com a rigidez e formalidade do Código de Bevilaqua.
O princípio da eticidade surge a partir da aproximação do Código ao caso real, no momento em que confere ao juiz não só poder para suprir lacunas, mas também para resolver, onde e quando previsto, de conformidade com valores éticos.
Funda-se o princípio da eticidade, segundo o Desembargador Carlos Roberto Gonçalves, no valor da pessoa humana como fonte de todos os demais valores, priorizando nas relações jurídicas a equidade, a probidade, a boa fé, a justa causa e os demais critérios éticos, conferido maior poder ao juiz para encontrar uma solução mais justa e equitativa, na aproximação do Direito Civil ao caso concreto, sendo, neste sentido “posto o equilíbrio econômico dos contratos como base ética de todo direito obrigacional”.
Decorrente de tal princípio surge uma nova figura ao direito, que é a possibilidade de intervenção do juiz face ao advento de situações imprevisíveis, que inesperadamente venham alterar os dados do problema, tornando a posição de um dos contratantes excessivamente onerosa, como nos casos dos artigos 157 (da Lesão), e 478 a  480 (da Resolução Por Onerosidade Excessiva), podendo ele balancear ou resolver o contrato em questão, valorando todas as conseqüências da cláusula “rebus sic stantibus”.
Como terceiro princípio temos o da Operabilidade, que pode ser traduzido por uma simples frase: “O direito é feito para ser efetivado, para ser exercido, operado”. Por essa razão, na confecção do novo Código foi evitado o bizantino, o complicado, afastando-se as perplexidades e complexidades.
Como exemplo claro desse posicionamento, temos a adoção pelo legislador do Código de 2002, de um critério seguro para distinguir prescrição de decadência, e pôr fim a uma longa dúvida.
Adota-se, pelo princípio da operabilidade, critérios simples e claros para a conceituação de certos institutos, porém, lembra Reale, que o mesmo princípio também originou a criação de algumas normas jurídicas abertas, para que a atividade social da mesma, na sua evolução, venha a alterar-lhe o conteúdo, e permitindo uma melhor aplicação ao caso concreto.
 

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